quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Certezas?!

"..tenho por princípios
Nunca fechar portas
Mas como mantê-las abertas
O tempo todo
Se em certos dias o vento
Quer derrubar tudo?..."

Essa inconstância que me move, o que fazer com ela? Jogar fora não posso!
Dar a alguém não ouso...e o vento derruba tudo..tudo..

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

...

Tenho me redescoberto por esses dias. Às vezes cheiro a leite, outras a flor. Isso é bom, apesar de ter na alma algumas marcas feitas a ferro quente, não mais sinto dor... Talvez sinta dó...mas isso eu vou deixar para depois, agora farei minhas unhas...

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Minha casa

É mais fácil
Cultuar os mortos
Que os vivos
Mais fácil viver
De sombras que de sóis
É mais fácil
Mimeografar o passado
Que imprimir o futuro...

Não quero ser triste
Como o poeta que envelhece
Lendo Maiakóvski
Na loja de conveniência
Não quero ser alegre
Como o cão que sai a passear
Com o seu dono alegre
Sob o sol de domingo...

Nem quero ser estanque
Como quem constrói estradas
E não anda
Quero no escuro
Como um cego tatear
Estrelas distraídas
Quero no escuro
Como um cego tatear
Estrelas distraídas...

Amoras silvestres
No passeio público
Amores secretos
Debaixo dos guarda-chuvas
Tempestades que não param
Pára-raios quem não tem
Mesmo que não venha o trem
Não posso parar
Tempestades que não param
Pára-raios quem não tem
Mesmo que não venha o trem
Não posso parar...

Veja o mundo passar
Como passa
Uma escola de samba
Que atravessa
Pergunto onde estão
Teus tamborins?
Pergunto onde estão
Teus tamborins?
Sentado na porta
De minha casa
A mesma e única casa
A casa onde eu sempre morei
A casa onde eu sempre morei
A casa onde eu sempre morei...

Zeca...

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

João e o pé...

Cortara muitos hectares de cana até conquistar a devida quantia em dinheiro para comprar a tal passagem para o sonho. Com as mãos negras e grossas da lida, um rosto de pele branca escondido sob a poeira e o suor víamos cintilar o desejo de voar, voar para o que chamava de sonho impossível. Atendia pela alcunha de João, como tantos outros. Sobrenome: Nordeste Brasil. No dia que comprara a passagem de um ônibus clandestino olhou através das poltronas rasgadas, das pessoas suadas, da carcaça desumana uma pequena abertura, uma passagem, um buraquinho onde de olhos fechados se jogou para cair na cidade do Rio de Janeiro. Não trouxera malas, não havia o que por dentro delas. Trouxera apenas no corpo uma camisa de botões branca e uma calça de linho antiga, presente de seus padrinhos, que por ventura haviam sido presenteados com vestimentas não mais usadas por seus patrões.

A viagem do veículo clandestino termina em uma rua qualquer no centro. Com alguns tostões, muita fome e nenhum destino João segue andando pelas calçadas. Observa pessoas sujas como se saíssem de um dia inteiro de trabalho no canavial. Não entende, mas havia tantas outras coisas que também não entedia, deixou por isso mesmo. Os dias passam o sonho não veio, o abrigo já não atende as necessidades mínimas, a rua volta a ser uma estrada de busca, norte de alguma mudança. As “amizades” surgem, a ingenuidade de João é um convite. A moradia cai do céu, ou levará ao céu. Um pequeno barraco para chamar de seu. Um pequeno quintal de terra e algumas sementes na mão. Eis que surge a pequena plantação de João. Não viera para cidade grande para cuidar de plantações, porém pagavam bem pela sua “hortaliça” e isso é o que estava valendo.

Dotado de uma ingenuidade pueril, João aos olhos dos outros era um grande cara-de-pau, um típico canastrão. Como poderia alguém tão ingênuo? Só poderia ser um ator representando muito bem um papel. A verdade é que João era de uma inocência impar, singular, não obtinha nenhum conhecimento sobre a arte de atuar, viera de um lugar onde a eletricidade, a educação e as verbas destinadas a fazer com que ela acontecesse fizeram a curva bem antes, acho que na mesma esquina em que Judas perdeu as botas. Matemática ele sabia, acho que já nascera sabendo quantas toneladas de cana cortada lhe dariam as modestas refeições semanais. Sua pequena horta prosperava. Pensava João: – Que bom negócio.

Certo dia cansou de comer a quentinha da tia Tereza, que sempre lhe pareceu um banquete em comparação ao que comeu durante boa parte de sua vida, decidiu cozinhar. Apanhou alguns molhos de “verdura” da sua horta, refogou metade e transformou em salada crua a outra. – O gosto é horrível! Constata João. – De certo isto não presta para comer. No entanto nem chegara a descobrir. Passaram-se dois dias e a manchete de um jornal popular dizia: “João e o pé de Maconha”. Em uma matéria de capa líamos: Nordestino leitor do conto infantil João e o pé de feijão vem para cidade do Rio de Janeiro enriquecer plantando maconha. E lá se foi nosso João tentar contar a sua história para as “autoridades”, história ingênua demais para esse Gigante; simples demais para a arte literária; real demais para ser ficção. João hoje sonha, sonha todos os dias e noites com a cana-de-açúcar, por que a “cana” que vem tendo é amarga e dura demais.

Nalgum lugar

Nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
De qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
No teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
Ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto
Teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
Embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
Me abres sempre pétala por pétala como a primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa (2x)
Ou se quiseres me ver fechado, eu e
Minha vida nos fecharemos belamente, de repente
Assim como o coração desta flor imagina
A neve cuidadosamente descendo em toda a parte;
Nada que eu possa perceber neste universo iguala
O poder de tua intensa fragilidade: cuja textura
Compele-me com a cor de seus continentes,
Restituindo a morte e o sempre cada vez que respira
(não sei dizer o que há em ti que fecha
E abre; só uma parte de mim compreende que a
Voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
Ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas


Zeca Baleiro

domingo, 11 de janeiro de 2009

Quintana!

''...E que fique muito mal explicado.
Não faço força para ser entendido.
Quem faz sentido é soldado..."

Mário Quintana.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

[noises] Parte I


[noises] Ruídos de uma pós-adolescência. Parte I


“Quando o carteiro chegou e meu nome gritou com a carta na mão” segurei meu cão pela coleira, mas o soltei em seguida e deixei que comesse as cartas (contas), afinal nutria uma fome de no mínimo três dias, não seria justo com ele querer que entendesse essa ridícula situação, era apenas um animal. Olhei de rabo de olho novamente para o carteiro, talvez eu o comesse. Deixaria para o cão suas roupas, uma péssima combinação de amarelo ovo e azul.
Bem, há dois meses quando vim para cá, trazia minha mala e alguns moveis. Na cabeça sonhos de liberdade, no entanto o que resta hoje na mesma cabeça é a palavra fome, no estomago também. Com o tempo nada mais parece um sonho. A “casa”, três cômodos em uma modesta vila, possuía paredes brancas que pareciam me transportar para as nuvens, hoje trazem manchas de infiltrações maquiadas por uma tinta que faz questão de se desfazer em pedaços pelo chão [irritante semelhança comigo]. Os vizinhos me procuram para reivindicarmos essas questões, mas me lembro que mais uma vez preciso procurar emprego.
Vinte e poucos anos, diplomas em punho, experiência vasta em estágios de como vencer na área, agora, nunca pensei que o que realmente contaria seria a experiência em gente. É isso mesmo! Gente com letras maiúsculas. Alguém sempre tem que te conhecer e você conhecer alguém. Diplomas de graduações, mestrados, afins são apenas papeis que um dia alguém dará para o cão comer. Lembro-me da minha mãe, em vários momentos de repressão ao meu jeito, dizer:
– Essa sua mania de gostar de gente...
Confesso que eu não entendia até dois meses atrás, mas agora entendo: “Gente não se gosta, se conhece, se usa e pronto”.
Chego à última entrevista do dia: Salto, calça slim fit, regata, lenço palestino no pescoço, óculos... Fiu... Fiu... Gostosa!!! [frase entoada pelo recepcionista do edifício]. Nem tudo parece estar perdido, dizem que para uma mulher o seu pior inferno astral é quando passa em frente uma construção e ouve apenas o silêncio. [risos no elevador] Tenho que me concentrar, enfim a entrevista: Sento-me e de forma serena respondo quase todas as perguntas. Enquanto minha boca fala o necessário, minha mente viaja profundamente em cada riso, choro, brincadeira, dificuldade, vontade de desistir, medo, glória, derrota, sentimentos comprimidos e representados por papeis que simbolizam cada ciclo iniciado e fechado ao longo da vida. Gasto todo meu potencial mental e profissional, porém levando em conta a última pergunta feita após um “entraremos em contato com você de acordo com as necessidades da empresa” as palavras de nada valeram. E a pergunta que ficou sem resposta foi: Quer sair comigo está noite?
Chego ao portão da vila, que talvez devesse chamar de casa. O cão ainda se diverte com os papeis tentando embrulhar o estômago, o meu canta ópera de tanta fome. Não entro. Pego o ônibus. Sento na janela. Tenho somente a ida, talvez não devesse mais voltar. Após quase uma hora de viaGem, salto na “minha casa”...agora casa de meus pais,onde sou uma visita, filha que retorna após dois meses de liberdade. Recebem-me com uma farta mesa. Palavras?! Eu não as tenho mais. Volto ao meu antigo quarto. Deito em minha eterna cama e durmo o sono de uma criança de cinco anos. Sem pressa e sem necessidade de acordar.

Van [?]

...aos meus amigos declarados ou não...


"Para ser possível viver na vida impossível eu escrevo" Moacir Scliar
Uma carapuça criada por Scliar que cai perfeitamente em todos nós.